quinta-feira, 12 de março de 2009

História e química forense: Napoleão morreu por envenenamento?


Após a derrota na batalha de Waterloo, em 1815, Napoleão foi exilado na ilha de Santa Helena, onde viveu por seis anos. De Napoleão resta ainda um vestígio material: cabelo. Foi feita uma análise química dos fios de cabelo e, em 1960, foi levantada a hipótese de que Napoleão não teria morrido de causas naturais, e sim envenenado.

Motivo da suspeita: a análise química revelou a presença de uma quantidade anormalmente alta de arsênio no cabelo de Napoleão.

Talvez sim...


O arsênio não é um dos chamados elementos essenciais (elementos que fazem parte da constituição química de vários seres vivos, incluindo os seres humanos, como o zinco e o magnésio, por exemplo), sendo apreciavelmente tóxico. Contudo, o arsênio, assim como muitos outros elementos químicos, não é tóxico quando na forma elementar (o elemento mesmo, e não um de seus compostos). Porém, o óxido de arsênio, de fórmula As2O3 é bastante tóxico. É um composto sólido, branco, com uma propriedade bastante útil para aqueles que desejam envenenar alguém: é solúvel em água, produzindo soluções incolores. Assim, pode ser acrescentado ao chá, café, refrigerante, cerveja etc. Além de tudo é insípido. Outra vantagem para o assassinato perfeito: é difícil de ser detectado por análises químicas convencionais, o que torna difícil a identificação da causa mortis no caso de uma autópsia.

Talvez não...


Contudo, no início dos anos 90, uma outra explicação para o alto teor de arsênio no cabelo de Napoleão, que não o envenenamento criminoso, foi levantada: o envenenamento por arsênio teria sido acidental.

Um suspeito inusitado


O papel de parede de um dos aposentos de Napoleão era verde, graças ao uso de um composto de arsênio, o arsenato de cobre, de fórmula CuHAsO4. Tratava-se de um pigmento verde muito utilizado na época de Napoleão.

O clima úmido da ilha de Santa Helena teria propiciado a formação de mofo no papel de parede. Os microrganismos que constituem o mofo teriam então convertido bioquimicamente o arsenato de cobre no composto trimetil arsênio, (CH3)3As, o qual é altamente volátil[1]. O trimetil arsênio é muito tóxico e, sendo também muito volátil, seria facilmente inalado por todos que estivessem na sala. Uma vez que Napoleão estava sempre por lá, deve ter respirado uma quantidade maior do composto do que qualquer outra pessoa.

Esta hipótese é corroborada pelo fato de que aqueles que visitavam Napoleão com certa regularidade queixavam-se de distúrbios gastrointestinais, além de outros sintomas característicos de envenenamento por arsênio. Reportavam ainda que sua saúde costumava melhorar quando realizavam atividades ao ar livre.

Notas

Texto adaptado de "Introdução à química forense", de Robson Fernandes de Farias.
[1] Fácil de passar para o estado gasoso.






2 comentários:

Rodrigo J. Fonseca disse...

Pois é, arsênio, assim como muitos outros elementos tóxicos, também eram usados como medicamentos. A idéia era levar a pessoa até o limite, matando a doença. Aí, se a pessoa fosse forte o suficiente, talvez ela se recuperasse e então estaria curada.
Arsênio também era usado como veneno para rato na época, então eles certamente deveriam ter isso em casa.

Juliana. disse...

Na verdade, até hoje o arsênio é usado como medicamento.
"O arsênico é bem sucedido no tratamento de infecções como a malária, sífilis e framboesiomas, e é também efetivo contra certos tipos de leucemia. No entanto, a exposição a longo prazo a arsênico em água potável tem sido ligada a cânceres de bexiga, pulmão, pele, rim, canais nasais, fígado e próstata."
(http://www.emedix.com.br/not/not2001/01nov13onc-jhmi-aao-arsenico.php)